Como pingar colírio de forma correta? Aumentando a eficácia do tratamento
Introdução
O uso de colírios é uma das formas mais comuns e eficazes de tratamento em diversas condições oftalmológicas. Porém, a eficácia do tratamento pode ser comprometida quando o colírio não é administrado corretamente. Muitos pacientes acreditam que pingar o colírio é um procedimento simples, mas vários estudos mostram que a maioria comete erros que prejudicam a absorção do medicamento e, consequentemente, o controle da doença.
Neste artigo, vamos abordar de forma clara e didática para que servem os colírios, quais doenças eles tratam, com ênfase no glaucoma, e como garantir a aplicação correta para melhorar os resultados do tratamento. Também destacaremos os erros mais comuns e como evitá-los, com base em estudos científicos e diretrizes clínicas.
Para que servem os colírios e para que tipo de doenças são indicados?
Colírios são medicamentos em forma líquida destinados à aplicação ocular. Eles podem conter diferentes substâncias e ter finalidades variadas. Veja algumas das indicações mais comuns:
- Lubrificar os olhos: colírios lubrificantes ou lágrimas artificiais são usados para aliviar sintomas de olho seco, sensação de areia, ardência e desconforto ocular. São especialmente indicados para quem passa muito tempo no computador ou em ambientes com ar-condicionado.
- Reduzir inflamações: os colírios anti-inflamatórios, tanto esteroides como não esteroides, são usados em casos de uveítes, pós-operatórios e outras inflamações oculares.
- Tratar infecções: colírios antibióticos, antifúngicos e antivirais são indicados para tratar conjuntivites e outras infecções oculares, devendo sempre ser prescritos por um médico.
- Controlar a pressão intraocular: essenciais no tratamento do glaucoma, esses colírios ajudam a reduzir a pressão dentro do olho, protegendo o nervo óptico.
- Anestésicos e midriáticos: utilizados em exames oftalmológicos ou procedimentos específicos para anestesiar o olho ou dilatar a pupila.

Cada tipo de colírio tem uma indicação específica, e seu uso deve ser sempre orientado por um oftalmologista. A automedicação pode ser perigosa, pois o uso incorreto pode piorar o quadro clínico ou mascarar sintomas importantes.
O que é o glaucoma e como é feito o tratamento?
O glaucoma é uma doença crônica, progressiva e silenciosa que afeta o nervo óptico, geralmente associada ao aumento da pressão intraocular (PIO). Se não for tratado, pode levar à perda progressiva da visão periférica e, em estágios avançados, à cegueira total. Por ser assintomático em suas fases iniciais, muitas vezes só é diagnosticado em estágios avançados.
A forma mais comum é o glaucoma primário de ângulo aberto, que ocorre devido a uma obstrução gradativa das vias de drenagem do humor aquoso. Outras formas incluem o glaucoma de ângulo fechado, congênito, pigmentário e o secundário a outras doenças ou uso de medicamentos.
O tratamento visa reduzir a PIO, sendo os colírios a primeira linha terapêutica. Em casos mais avançados, podem ser indicadas terapias com laser ou cirurgias. A escolha do tratamento depende do tipo de glaucoma, da resposta do paciente e da presença de outras comorbidades.
Os principais tipos de colírios usados para tratar o glaucoma incluem:
- Análogos de prostaglandinas: aumentam o escoamento do humor aquoso. Ex: latanoprosta, travoprosta.
- Beta-bloqueadores: reduzem a produção de humor aquoso. Ex: timolol.
- Inibidores da anidrase carbônica: também diminuem a produção de líquido. Ex: dorzolamida.
- Agonistas alfa-adrenérgicos: como a brimonidina, que atua em ambas as frentes: reduz a produção e aumenta a drenagem do humor aquoso.
A eficácia do tratamento depende da escolha do medicamento adequado, da adesão do paciente e, especialmente, da forma correta de aplicação do colírio.
Qual a forma mais indicada de se pingar o colírio para pacientes com glaucoma?
Muitos pacientes com glaucoma cometem erros na aplicação do colírio. Um estudo publicado no Current Opinion in Ophthalmology revelou que entre 18,2% e 80% dos pacientes contaminam o frasco ao encostar no olho ou na pele; 11,3% a 60,6% não aplicam apenas uma gota; e até 37,3% perdem a gota por falha de mira.
Para garantir que o medicamento atue de forma eficaz, é importante seguir estas recomendações:
- Lave bem as mãos com água e sabão. Nunca aplique colírio com as mãos sujas.
- Agite o frasco caso a bula recomende.
- Incline a cabeça para trás ou deite-se em uma superfície plana e confortável.
- Com um dedo limpo, puxe suavemente a pálpebra inferior formando uma pequena bolsa.
- Segure o frasco com a outra mão, com cuidado para não tocar na ponta com os dedos.
- Pingue uma única gota no centro da bolsa conjuntival, sem encostar o frasco no olho.
- Feche os olhos com suavidade e mantenha-os fechados por 1 a 2 minutos.
- Pressione com delicadeza o canto interno do olho (canto nasal) com um dedo por 1 a 2 minutos. Isso reduz a absorção do colírio pelo organismo e aumenta sua permanência no olho.

- Se precisar usar outro colírio, aguarde de 5 a 10 minutos entre uma aplicação e outra. Isso evita que um medicamento dilua o outro.
Essas técnicas, como oclusão do canal lacrimal e fechamento palpebral, são respaldadas por estudos da Cochrane e de centros especializados como o All India Institute of Medical Sciences.
Erros comuns ao se pingar o colírio
Mesmo pacientes disciplinados podem cometer erros que afetam a eficácia do tratamento. Os erros mais frequentes incluem:
- Encostar o bico do frasco no olho ou cílios, o que pode contaminar o conteúdo e causar infecções.
- Instilar várias gotas seguidas, acreditando que isso aumenta o efeito do medicamento. Na verdade, o olho só consegue absorver uma gota por vez.
- Deixar a gota escorrer fora do olho por falta de atenção ou erro na mira.
- Não respeitar o intervalo entre colírios diferentes, o que pode causar interações ou reduzir a eficácia.
- Armazenar o colírio em local inadequado, como no carro ou perto de fontes de calor, o que compromete sua estabilidade.
- Usar colírios vencidos, com validade expirada ou após o prazo recomendado após a abertura (geralmente 30 dias).
- Não pressionar o canto do olho, o que pode levar à absorção sistêmica do medicamento e causar efeitos adversos como bradicardia e hipotensão.
Dicas adicionais para pacientes com dificuldades motoras ou visuais
Pacientes idosos ou com limitações motoras podem ter dificuldades em aplicar o colírio corretamente. Algumas estratégias úteis incluem:
- Utilizar dispositivos de auxílio, como adaptadores de frascos que direcionam a gota.
- Pedir ajuda a um cuidador ou familiar treinado.
- Usar um espelho e boa iluminação para facilitar o posicionamento correto.
- Assistir vídeos educativos sobre a técnica correta, muitos deles disponíveis em sites de instituições confiáveis.
Importância da adesão ao tratamento
O sucesso do tratamento do glaucoma está diretamente relacionado à adesão correta ao uso dos colírios. Interromper o uso, pular doses ou aplicar de forma inadequada compromete o controle da pressão intraocular e pode levar à progressão da doença.
Estudos indicam que a orientação adequada por parte do oftalmologista aumenta significativamente a taxa de adesão ao tratamento. O ideal é que o paciente receba uma demonstração prática no consultório, e que retorne com frequência para reavaliação e reforço das orientações.
Conclusão
A correta instilação de colírios é fundamental para o sucesso terapêutico, especialmente em condições crônicas como o glaucoma. Pequenas mudanças na técnica de aplicação fazem uma grande diferença na absorção do medicamento e no controle da doença.
Se você faz uso de colírios, converse com seu oftalmologista sobre a sua técnica de aplicação. Muitas vezes, uma simples demonstração pode corrigir erros que passam despercebidos por anos. O cuidado com os olhos começa com informação, atenção aos detalhes e comprometimento com a própria saúde.
A saúde ocular depende não apenas do diagnóstico correto e do medicamento prescrito, mas também da sua atitude frente ao tratamento. Seja protagonista no cuidado com a sua visão!
Dr. Aron Guimarães é médico oftalmologista especialista pela USP/SP e com mestrado e doutorado pela UNICAMP.
Saiba mais em aronguimaraes.com.br
Fontes:
- Xu L, Wang X, Wu M. Topical medication instillation techniques for glaucoma. Cochrane Database of Systematic Reviews, 2017. Link
- Davis SA, et al. Drop instillation and glaucoma. Current Opinion in Ophthalmology, 2018.
- Gupta R, et al. Evaluating Eye Drop Instillation Technique in Glaucoma Patients. Journal of Glaucoma, 2012.
- Sarkis S, et al. Challenging glaucoma with emerging therapies: an overview of advancements against the silent thief of sight. Frontiers in Medicine, 2025.
Perguntas de pacientes sobre uso de colírios.
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Como saber se estou pingando o colírio corretamente?
Você saberá que aplicou corretamente se a gota cair no interior do olho, mais precisamente no saco conjuntival, e você não sentir o líquido escorrendo para fora. Após aplicar, mantenha os olhos fechados suavemente por até 2 minutos e pressione levemente o canto interno do olho, o que ajuda na absorção e evita que o remédio vá para o restante do corpo.
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O que acontece se eu pingar mais de uma gota por vez?
O olho não consegue absorver mais do que uma gota por vez, então o excesso acaba escorrendo e sendo desperdiçado. Além disso, isso pode aumentar o risco de efeitos colaterais sistêmicos, principalmente em colírios usados no tratamento do glaucoma.
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É necessário fechar o olho depois de aplicar o colírio?
Sim, é uma etapa fundamental. Fechar os olhos suavemente (sem apertar) ajuda a manter a gota em contato com a superfície ocular por mais tempo, potencializando o efeito do medicamento. Pressionar levemente o canto interno também evita que o colírio seja drenado para o sistema nasal e absorvido pela corrente sanguínea.
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Posso usar dois colírios diferentes seguidos?
Pode sim, mas é importante respeitar um intervalo de pelo menos 5 minutos entre um e outro. Isso garante que o primeiro colírio seja absorvido corretamente antes da aplicação do segundo, evitando diluição ou interação entre as substâncias.
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O que fazer se o colírio escorrer para fora do olho?
Se você tiver certeza de que a gota não atingiu o olho, pode reaplicá-la. Mas se o líquido escorrer após o contato, apenas seque o excesso com um lenço limpo e aguarde a próxima dose no horário habitual. Evite aplicar mais de uma gota desnecessariamente.
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Preciso lavar o olho antes de aplicar o colírio?
Não é necessário lavar os olhos antes da aplicação, a não ser que esteja com secreção. O mais importante é lavar bem as mãos para evitar a introdução de germes no olho durante o procedimento.
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Posso encostar o frasco no olho?
Não. Encostar o bico do frasco no olho ou cílios pode contaminar o colírio com bactérias e causar infecções oculares. Mantenha o frasco a uma curta distância do olho, mas sem contato.
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Colírio vencido ainda faz efeito?
Colírios vencidos perdem estabilidade e podem não ter o efeito esperado. Além disso, após abertos, muitos colírios têm validade de apenas 30 dias. Usar colírios fora do prazo pode ser perigoso e deve ser evitado.
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Quanto tempo devo esperar entre a aplicação e enxaguar o rosto?
O ideal é esperar cerca de 10 a 15 minutos antes de lavar o rosto, para garantir que o colírio seja bem absorvido e não seja removido pela água.
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Esqueci de pingar o colírio no horário certo, o que faço?
Assim que lembrar, aplique a gota, desde que não esteja muito próximo da próxima dose. Se estiver, pule a dose esquecida e retome o horário normal. Não tente compensar aplicando duas doses juntas, isso pode causar efeitos indesejados.