Óculos para Controle da Miopia: Como Funcionam?
1. O que é miopia?
A miopia é um distúrbio refrativo em que os olhos crescem demais no sentido axial, fazendo com que a imagem dos objetos distantes seja focada antes da retina. Isso resulta em visão embaçada para longe, embora a visão de perto permaneça clara. A condição costuma se manifestar na infância ou adolescência e tende a progredir com o tempo.
2. Por que temos cada vez mais casos de miopia?
O aumento global da miopia tem sido associado a fatores ambientais, como o tempo excessivo em atividades de perto (como uso de telas) e a redução da exposição à luz natural. Estimativas sugerem que, até 2050, metade da população mundial poderá ser míope. Isso representa um desafio de saúde pública, já que a miopia elevada está associada a doenças oculares graves, como o descolamento de retina e a maculopatia míope.
3. Quais os fatores de risco para a miopia progredir?
A progressão da miopia está ligada a fatores genéticos (pais míopes aumentam o risco), idade precoce de início, alto tempo de leitura ou uso de telas, pouca atividade ao ar livre e histórico de progressão rápida. Além disso, estudos apontam que o desfoque periférico hipermetrópico (quando a periferia da retina recebe imagem desfocada para trás) pode estimular o crescimento axial do olho.
4. Como óculos especiais funcionam para prevenir a miopia?
Diferentemente dos óculos convencionais, os óculos para controle da miopia não têm como objetivo apenas corrigir a visão, mas também agir terapeuticamente. Esses modelos são projetados para criar um desfoque míope na periferia da retina, com o intuito de frear o crescimento excessivo do globo ocular.
O fundamento fisiológico está na hipótese de que a retina periférica é sensível ao tipo de imagem que recebe. Quando exposta a um desfoque hipermetrópico (a imagem se forma atrás da retina), ela envia sinais bioquímicos que estimulam o crescimento do olho, agravando a miopia. Ao inverter esse sinal, criando um desfoque míope (a imagem se forma antes da retina) de maneira controlada na periferia, os óculos conseguem reduzir ou até mesmo interromper esse crescimento axial.
Entre as tecnologias mais conhecidas estão:
- Lentes com segmentos múltiplos de desfoque (DIMS): como as MiYOSMART, possuem uma zona central clara para visão nítida e uma região periférica com centenas de pequenos segmentos com poder positivo (+3,50D), criando um desfoque míope. Estudos mostraram que elas podem reduzir a progressão da miopia em até 60%. Sua tecnologia também permite boa tolerância visual, mesmo durante atividades escolares ou uso prolongado.
- Lentes com microlentes asféricas (Stellest): apresentam microlentes em anéis concéntricos ao redor de uma zona clara central. Essas microlentes induzem um desfoque míope mais controlado e eficaz. Ensaios clínicos relatam redução de mais de 65% na progressão da miopia. Estudos com grupos controle mostraram que após dois anos de uso, as crianças que usaram Stellest tiveram crescimento axial significativamente menor.
- Lentes com padrão cilíndrico em anel (MyoCare): da Zeiss, usam um design de anéis com padronização cilíndrica para promover um efeito semelhante ao das lentes anteriores. Embora mais recentes, já demonstraram potencial terapêutico comparável.
Esses óculos funcionam com base na teoria de que a retina periférica também participa do controle do crescimento ocular. Ao proporcionar um desfoque míope constante nessa região, os óculos enviam um “sinal de freio” ao crescimento do olho. Além disso, ao preservar a visão central clara, garantem conforto visual e boa qualidade de vida para crianças e adolescentes.
Estudos revisados também indicam que esses óculos têm boa tolerância pelos usuários e são uma alternativa segura e eficaz frente a outras terapias como colírios de atropina ou ortoceratologia. Também têm a vantagem de serem menos invasivos e de mais fácil adesão no longo prazo, especialmente em crianças pequenas.
5. Quais as marcas comerciais disponíveis para esse uso e suas vantagens e desvantagens?
– MiYOSMART (Hoya): Preço no Brasil – R$1900,00-R$2100,00 o par de lentes.
Vantagens: ótima evidência científica, conforto visual, fácil adaptação, design robusto, com 396 microlentes periféricas bem distribuídas que equilibram efeito terapêutico e qualidade visual.
Desvantagens: leve perda de contraste periférico em ambientes com pouca luz. Alguns relatos de reflexos periféricos em certas iluminações.
Detalhes sobre a lente Myosmart da Hoya
– Stellest (Essilor): Preço no Brasil – R$2000,00-R$2500,00 o par de lentes.
Vantagens: tecnologia com microlentes asféricas, alta eficácia na redução da miopia. Estudos multicêntricos demonstraram melhora consistente na estabilização do crescimento axial. Apresenta design que favorece conforto visual mesmo em atividades esportivas.
Desvantagens: custo elevado em relação a óculos comuns. Ainda não amplamente disponível em todas as óticas.
]
Detalhes sobre a lente Stellest da Essilor
– MyoCare (ZEISS): Preço no Brasil – R$2000,00-R$2800,00 o par de lentes.
Vantagens: design inovador com anéis cilíndricos de tratamento, boa qualidade de visão central, opção mais recente no mercado, com potencial para evolução futura.
Desvantagens: menos estudos comparativos publicados até o momento, o que pode dificultar decisão em casos mais complexos.
Detalhes sobre a lente Myocare da Zeiss
– Perifocal (ArtOptica):
Vantagens: atua por adição progressiva nas zonas nasal e temporal, com design horizontal que pode beneficiar alguns padrões refrativos.
Desvantagens: menos dados clínicos disponíveis, variação de efeito conforme o perfil de refração periférica do paciente.
A escolha da marca ideal depende do perfil visual da criança, do grau de miopia, da resposta à terapêutica e também do estilo de vida. A avaliação com um oftalmologista especializado é essencial para direcionar a melhor escolha.
Leia também: Outras formas de se controlar a miopia
6. Conclusão
Os óculos para controle da miopia representam uma revolução na oftalmologia pediátrica. Ao aliarem correção visual com estratégias terapêuticas, oferecem aos pais uma solução segura, eficaz e cientificamente respaldada para proteger a visão de seus filhos. Com diferentes marcas disponíveis, é essencial contar com orientação especializada para escolher a melhor opção.
Dr. Aron Guimarães é médico oftalmologista especialista pela USP/SP e com mestrado e doutorado pela UNICAMP.
Referências:
- Lin Z, Christaras D, Duarte-Toledo R, et al. Dynamic accommodation responses in subjects wearing myopia control spectacles modifying peripheral refraction. Invest Ophthalmol Vis Sci. 2025;66(1):55.
- Papadogiannis P, Börjeson C, Lundström L. Comparison of optical myopia control interventions: effect on peripheral image quality and vision. Biomed Opt Express. 2023;14(7):3125.
- Carlà MM, Boselli F, Giannuzzi F, et al. Overview on Defocus Incorporated Multiple Segments Lenses: A Novel Perspective in Myopia Progression Management. Vision (Basel). 2022;6(2):20.
- Erdinest N, London N, Lavy I, et al. Peripheral Defocus and Myopia Management: A Mini-Review. Korean J Ophthalmol. 2023;37(1):70-81.
Perguntas e repostas
1. Meu filho tem apenas 6 anos e já está míope. Esses óculos funcionam bem para crianças tão novas?
Sim, quanto mais cedo for iniciado o tratamento com óculos de controle da miopia, maior a chance de frear a progressão. Crianças a partir de 5 anos já podem usar esse tipo de lente, desde que consigam colaborar com o uso constante e sejam acompanhadas regularmente pelo oftalmologista.
2. Há risco desses óculos prejudicarem a visão normal do meu filho?
Não. Esses óculos mantêm uma zona central totalmente clara para a visão, permitindo que a criança enxergue perfeitamente para longe e para perto. O tratamento age apenas na região periférica da retina, sem comprometer a visão central.
3. Meu filho reclama que vê reflexos ou “borrões” com os óculos. Isso é normal?
Alguns usuários podem notar reflexos periféricos ou leve alteração de contraste, principalmente em ambientes escuros. Geralmente, a adaptação ocorre em poucos dias. Caso persista, o modelo da lente pode ser reavaliado.
4. Se meu filho parar de usar esses óculos, a miopia volta a piorar mais rápido?
A interrupção do uso pode sim permitir que a miopia continue progredindo. Por isso, o uso contínuo é fundamental durante o período de crescimento ocular ativo (geralmente até os 15-17 anos).
5. Posso usar esse tipo de óculos também? Tenho 30 anos e sou míope.
Esses óculos são projetados principalmente para controlar a progressão da miopia em crianças e adolescentes. Em adultos, o crescimento ocular já cessou, então o efeito terapêutico não é relevante. Contudo, a tecnologia pode ser útil em casos específicos, como em adultos jovens com miopia progressiva.
6. Esses óculos substituem o uso de colírio de atropina?
Eles são uma alternativa eficaz e não invasiva. Em alguns casos, o oftalmologista pode até combinar as duas terapias para obter um efeito maior, mas isso depende do grau de progressão e perfil da criança.
7. É possível usar óculos de controle da miopia com lentes fotossensíveis (que escurecem no sol)?
Sim, muitas marcas oferecem a possibilidade de incluir tratamentos como antirreflexo, proteção UV e lentes fotossensíveis, desde que respeitada a configuração terapêutica da lente.
8. Quanto tempo meu filho precisa usar esses óculos por dia para ter efeito?
O ideal é que os óculos sejam usados durante todo o dia, especialmente em atividades escolares e leitura. O uso parcial reduz a eficácia do tratamento.
9. Existe um grau de miopia em que esses óculos deixam de funcionar?
Eles são eficazes em diversos graus, especialmente entre -0,50 e -6,00. Em casos de miopia muito alta, pode ser necessário associar outras abordagens, mas os óculos continuam ajudando a desacelerar a progressão.
10. Preciso trocar os óculos a cada quanto tempo?
As lentes devem ser revisadas a cada 6 a 12 meses, conforme orientação médica. Se houver aumento do grau, quebra ou desgaste das lentes, a troca deve ser antecipada para manter a eficácia do tratamento.