Lente nacional (esférica) para cirurgia de catarata. É boa? É segura?
A catarata é uma condição comum que reduz a visão e é tratada com cirurgia, onde se implanta uma lente intraocular (LIO). No Brasil, os planos de saúde e o SUS geralmente utilizam lentes nacionais esféricas, que são eficazes, mas podem comprometer a qualidade visual, especialmente à noite.
Lentes asféricas, (disponíveis normalmente com custo adicional), proporcionam melhor contraste, menos reflexos e uma visão mais nítida. Investir em uma lente superior (quando possível) pode aumentar significativamente o conforto visual e a satisfação do paciente.
-
O que é a catarata e como é feita a cirurgia?
A catarata é uma condição ocular em que o cristalino natural do olho se torna progressivamente opaco, levando à perda gradual da visão. Essa opacificação ocorre com mais frequência com o envelhecimento, mas também pode estar associada a fatores como diabetes, uso prolongado de corticóides, traumatismos oculares e algumas doenças congênitas.
O tratamento da catarata é exclusivamente cirúrgico. A cirurgia moderna é realizada por meio da facoemulsificação: uma técnica segura e eficiente, na qual o cristalino opaco é fragmentado por ultrassom e removido, sendo substituído por uma lente intraocular (LIO).
Essa lente artificial é implantada permanentemente dentro do olho e tem a função de restaurar a capacidade de foco, devolvendo a nitidez visual ao paciente.
No Brasil, tanto o Sistema Único de Saúde (SUS) quanto a maioria dos convênios de saúde oferecem a cirurgia de catarata com lentes intraoculares monofocais esféricas (chamaremos nesse texto de lente nacional), fabricadas por empresas nacionais. No entanto, existem diferenças importantes entre essas lentes e as versões mais modernas, como as esféricas (chamaremos nesse texto de lente importada).
-
Como é a visão de quem colocou uma lente nacional (esférica) e qual a diferença para uma lente superior (como a asférica)?
As lentes esféricas, comumente oferecidas pelos convênios e pelo SUS, possuem uma superfície curva igual em todas as direções, semelhante a uma esfera. Apesar de corrigirem a visão de forma eficaz, essas lentes não compensam as aberrações esféricas naturais da córnea, especialmente em pupilas maiores e em condições de baixa luminosidade. Isso pode resultar em uma visão menos nítida, especialmente em situações de contraste reduzido, como dirigir à noite.
Estudos científicos, como o publicado por Sandoval et al. (2008), mostram que pacientes que recebem lentes importadas (asféricas) têm uma redução significativa das aberrações de alta ordem e da aberração esférica total, resultando em uma visão mais nítida, com melhor sensibilidade ao contraste e menos halos e reflexos incômodos à noite.
Outra pesquisa, conduzida por Trueb et al. (2009), confirmou que as lentes importadas (asféricas) proporcionam melhor sensibilidade ao contraste em condições fotópicas e mesópicas, ou seja, tanto em ambientes bem iluminados quanto em luz baixa. Isso significa que o paciente enxerga melhor os detalhes e com maior definição.
Um terceiro estudo, de meta-análise publicado por Schuster et al. (2013), reuniu dados de 43 estudos com mais de 4 mil olhos operados. O resultado mostrou que, embora a acuidade visual corrigida (letras da tabela de visão) seja semelhante entre lentes nacionais (esféricas) e importadas (esféricas), a sensibilidade ao contraste é consistentemente superior nas lentes asféricas.

-
Vale a pena investir em uma lente superior?
Essa é uma dúvida muito comum. Se por um lado a lente nacional (esférica) oferece um resultado satisfatório para a maioria das pessoas, por outro lado, pacientes mais exigentes, ativos e que desejam melhor desempenho visual, especialmente à noite, podem se beneficiar significativamente das lentes importadas (esféricas).
Nos convênios de saúde, é possível realizar um “upgrade” da lente, pagando apenas a diferença entre o valor da LIO coberta pelo plano e o custo da lente importada (esférica). Essa possibilidade deve ser discutida com o oftalmologista antes da cirurgia. O investimento extra pode ser pequeno diante dos benefícios na qualidade visual.
Estudos como o de Wei Du et al. (2019) reforçam que a lente importada (asférica) não apenas melhora a sensibilidade ao contraste, mas também proporciona uma visão mais próxima da fisiologia natural do olho jovem. Isso se traduz em mais conforto visual, segurança para dirigir, ler e realizar atividades sob diferentes condições de iluminação.
Pacientes que costumam dirigir à noite, ler muito, usar o computador com frequência ou desejam mais nitidez para atividades detalhadas, geralmente relatam maior satisfação após o implante da lente importada (esférica).
Leia também: Quanto custa cada tipo de lente?
-
Conclusão
A lente intraocular esférica nacional, amplamente utilizada em cirurgias pelo SUS e convênios, é segura e eficaz na maioria dos casos. No entanto, avanços na tecnologia óptica permitiram o desenvolvimento das lentes asféricas, que oferecem melhor qualidade visual, principalmente em situações de contraste baixo e em ambientes escuros.
A decisão entre manter a lente fornecida pelo plano de saúde ou optar por uma lente superior deve ser individualizada, considerando os hábitos, expectativas e estilo de vida do paciente. O investimento em uma lente asférica pode representar um ganho significativo em conforto, segurança e qualidade de vida.
Converse com seu oftalmologista sobre as opções disponíveis. Uma escolha bem informada é essencial para um resultado cirúrgico ainda mais satisfatório.
Dr. Aron Guimarães é médico oftalmologista especialista pela USP/SP e com mestrado e doutorado pela UNICAMP.
Saiba mais em aronguimaraes.com.br
Perguntas de pacientes sobre o tema:
O que é uma lente intraocular (LIO) esférica (chamada popularmente de nacional)?
A lente intraocular esférica tem uma curvatura uniforme em toda a sua superfície óptica. Ela é usada para substituir o cristalino opaco retirado durante a cirurgia de catarata, mas não compensa as aberrações esféricas naturais da córnea, o que pode comprometer a qualidade da visão, especialmente em ambientes com pouca luz.
Qual a diferença entre uma lente esférica e uma asférica?
A principal diferença está no design óptico: lentes asféricas têm uma curvatura que varia do centro para a periferia, reduzindo aberrações esféricas e proporcionando uma visão mais nítida e com melhor contraste, principalmente em condições de baixa luminosidade.
Se a lente esférica é mais simples, ela é menos segura?
Não. As lentes esféricas são seguras e eficazes para a maioria dos pacientes. A segurança da cirurgia não depende do tipo de lente, mas sim da técnica cirúrgica e da experiência do cirurgião. A diferença está na qualidade visual obtida após a cirurgia.
A lente fornecida pelo SUS é ruim?
Não é ruim. A lente esférica fornecida pelo SUS é funcional e segura, mas pode não oferecer a mesma qualidade de visão que uma lente asférica, especialmente em condições específicas como dirigir à noite ou realizar atividades com pouca luz.
Vale a pena pagar a diferença para colocar uma lente asférica?
Sim, para muitos pacientes vale a pena. A lente asférica oferece uma visão com maior nitidez, menos distorções e melhor desempenho visual em diversas situações. É um investimento na qualidade de vida visual, principalmente para quem tem uma rotina visual exigente.
Quem pode se beneficiar mais das lentes asféricas?
Pacientes ativos, que dirigem à noite, usam muito o computador, leem com frequência ou têm maior sensibilidade visual tendem a se beneficiar mais das lentes asféricas, pois perceberão uma diferença maior na nitidez e no conforto visual.
As lentes asféricas corrigem a visão de perto e de longe?
Não necessariamente. A maioria das lentes asféricas são monofocais, ou seja, corrigem a visão para uma única distância (geralmente longe). Para corrigir a visão de perto e de longe, existem lentes multifocais, que podem ou não ter design asférico.
As lentes nacionais não têm versão asférica?
Alguns fabricantes nacionais já produzem lentes com design asférico, mas a maior parte das lentes asféricas de melhor performance visual ainda são importadas e possuem tecnologia mais avançada de fabricação e controle de qualidade.
Como é feito o cálculo da lente antes da cirurgia?
O oftalmologista realiza exames específicos para medir o comprimento do olho, a curvatura da córnea e outras variáveis. Esses dados são usados para calcular o grau ideal da lente e, se for o caso, avaliar a indicação de uma lente asférica personalizada.
Se eu colocar uma lente nacional, posso trocar depois?
Tecnicamente é possível trocar a lente (explante), mas não é um procedimento simples e só é indicado em casos específicos. Por isso, o ideal é tomar uma decisão bem informada antes da cirurgia, considerando todas as opções com seu oftalmologista.
Como saber qual lente é melhor para mim?
A melhor lente depende do seu estilo de vida, expectativas visuais e condição ocular individual. Converse com seu oftalmologista, que avaliará seu caso e poderá orientar se a lente fornecida pelo plano ou SUS é suficiente ou se vale investir em uma lente superior.
Referências
- SANDOVAL, H. P. et al. Comparison of visual outcomes, photopic contrast sensitivity, wavefront analysis, and patient satisfaction following cataract extraction and IOL implantation: aspheric vs spherical acrylic lenses. Eye, v. 22, p. 1469–1475, 2008. Disponível em: https://doi.org/10.1038/sj.eye.6702925
- TRUEB, P. R. et al. Visual acuity and contrast sensitivity in eyes implanted with aspheric and spherical intraocular lenses. Ophthalmology, v. 116, n. 5, p. 890–895, 2009. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.ophtha.2008.12.002
- SCHUSTER, A. K. et al. The impact on vision of aspheric to spherical monofocal intraocular lenses in cataract surgery: a systematic review with meta-analysis. Ophthalmology, v. 120, n. 11, p. 2166–2175, 2013. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.ophtha.2013.04.011
- DU, W.; LOU, W.; WU, Q. Personalized aspheric intraocular lens implantation based on corneal spherical aberration: a review. International Journal of Ophthalmology, v. 12, n. 11, p. 1788–1792, 2019. Disponível em: https://doi.org/10.18240/ijo.2019.11.19