Descolamento de Retina Após Cirurgia de Catarata: Saiba Mais
É verdade que após a cirurgia de catarata há um risco aumentado de descolamento de retina no mesmo olho operado?
Sim, é verdade. Estudos demonstram que há um aumento real, embora pequeno, no risco de descolamento de retina após a cirurgia de catarata. Segundo um estudo realizado na Dinamarca, a incidência acumulada de descolamento de retina após a facoemulsificação foi de 0,39%, o que representa um risco aproximadamente 2,3 vezes maior do que o observado na população que não foi submetida à cirurgia — especialmente entre homens mais jovens, com olhos de eixo axial longo e em casos com complicações cirúrgicas, como ruptura da cápsula posterior ou perda de vítreo.
Esse risco é particularmente relevante para pacientes com miopia elevada, uma vez que esses olhos têm a retina mais esticada e fina, o que os torna mais vulneráveis a rupturas. A idade também é um fator: pacientes mais jovens têm maior propensão ao descolamento devido à estrutura ocular mais preservada, o que paradoxalmente favorece o descolamento em caso de tração do vítreo.
Além disso, a manipulação intraocular, inevitável durante o procedimento de facoemulsificação, pode gerar microtraumas que desencadeiam alterações vítreo-retinianas, favorecendo o aparecimento de rupturas na retina periférica, que são a principal causa do descolamento regmatogênico.
Imagem ilustrativa: Repare que as veias se localizam na região da retina.
O que é descolamento de retina e o que é catarata?
A retina é uma camada fina de tecido nervoso localizada na parte posterior do olho, responsável por captar a luz e enviar as informações visuais ao cérebro. Quando ocorre o descolamento de retina, essa camada se separa da parede interna do olho (a coroide), interrompendo o suprimento de oxigênio e nutrientes. Isso pode resultar em perda visual permanente se não for tratado rapidamente.
Existem três tipos principais de descolamento de retina:
- Descolamento regmatogênico: causado por uma ruptura na retina que permite a entrada de líquido sub-retiniano.
- Descolamento tracional: decorrente da tração da retina por tecido fibrovascular, comum em pacientes com retinopatia diabética proliferativa.
- Descolamento exsudativo: sem rupturas, causado por inflamações, tumores ou doenças vasculares que fazem o líquido se acumular sob a retina.
Já a catarata é uma doença ocular caracterizada pela opacificação progressiva do cristalino, a lente natural do olho. Essa opacificação impede a passagem adequada da luz até a retina, comprometendo a visão. Com o tempo, a visão se torna nublada, amarelada e pode surgir dificuldade para ler, dirigir ou enxergar com pouca luz. A catarata é uma das principais causas de cegueira tratável no mundo.
Como funciona a cirurgia de catarata e por que o risco de descolamento de retina aumenta?
A cirurgia de catarata moderna é feita majoritariamente pela técnica de facoemulsificação, que utiliza ondas de ultrassom para fragmentar o cristalino opaco, que é então aspirado. Em seguida, uma lente intraocular (LIO) é implantada no mesmo lugar, restaurando a transparência do sistema óptico ocular.
Apesar de ser um procedimento altamente seguro, certos fatores podem contribuir para complicações.
A ruptura da cápsula posterior, por exemplo, pode permitir a migração do vítreo para a câmara anterior, o que facilita trações sobre a retina e pode levar ao descolamento. A vitrectomia anterior, realizada para limpar o vítreo que prolapsa durante a cirurgia, também é um fator de risco reconhecido.
Além disso, o uso do laser Nd:YAG para tratar a opacificação da cápsula posterior (complicação tardia comum) tem sido associado, em algumas séries, a um discreto aumento no risco de descolamento de retina, especialmente se o paciente já apresenta fatores predisponentes.
Estudos mostram que pacientes jovens, homens e com olhos mais longos (maior que 24 mm de eixo axial) são os mais propensos a esse tipo de complicação.
Em pacientes com média de idade de 60,5 anos, a taxa de descolamento foi consideravelmente superior à de pacientes mais idosos.
Outros fatores que podem aumentar esse risco incluem:
- Trauma ocular prévio: pode enfraquecer as estruturas retinianas.
- Histórico familiar de descolamento de retina: indica predisposição genética.
- Doenças degenerativas da retina periférica: como degeneração lattice.
- Inflamações intraoculares crônicas.
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Qual o tratamento para o descolamento de retina?
O tratamento do descolamento de retina é sempre cirúrgico e requer urgência, pois quanto mais tempo a retina permanecer descolada, maiores são as chances de dano irreversível.
As opções incluem:
- Retinopexia pneumática: uma bolha de gás é injetada dentro do olho para empurrar a retina de volta à parede ocular, em conjunto com aplicação de laser ou crioterapia para selar a ruptura.
- Retinopexia com faixa escleral: envolve a colocação de uma faixa de silicone ao redor do globo ocular para empurrar mecanicamente a parede ocular contra a retina.
- Vitrectomia pars plana: remove-se o vítreo, aplica-se laser para soldar a retina e injeta-se gás ou óleo de silicone no olho para manter a retina aderida.
A escolha do procedimento depende da extensão do descolamento, localização da ruptura, tempo de evolução e condição geral do olho.
Em casos mais complexos, como descolamentos tracionais ou recorrentes, pode ser necessária a combinação de técnicas cirúrgicas ou mesmo cirurgias múltiplas para restabelecer a anatomia retiniana e preservar a função visual.
Quais outras complicações possíveis após a cirurgia de catarata?
Apesar de segura, a cirurgia de catarata não é isenta de riscos. As principais complicações incluem:
- Opacificação da cápsula posterior: conhecida como “catarata secundária”, é tratada com o laser Nd:YAG.
- Endoftalmite: infecção grave que pode comprometer gravemente a visão.
- Edema macular cistóide: acúmulo de líquido na mácula que afeta a visão central.
- Deslocamento ou descentralização da lente intraocular.
- Aumento da pressão intraocular: especialmente em pacientes glaucomatosos.
- Inflamação intraocular prolongada.
Estudos demonstram que a experiência do cirurgião também influencia nas complicações: residentes e médicos em treinamento apresentam taxas mais elevadas de ruptura de cápsula posterior e outras intercorrências.
Comorbidades como diabetes mellitus também aumentam o risco de complicações pós-operatórias, como a endoftalmite. Segundo uma metanálise publicada em 2025, pessoas com diabetes apresentaram risco 1,17 vezes maior de desenvolver essa complicação após a cirurgia.
Outras possíveis complicações incluem:
- Disfotopsias: reflexos ou halos ao redor de luzes.
- Hemorragia intraocular.
- Descolamento do corpo vítreo posterior.
- Cistos ou membranas epirretinianas.
Essas condições, embora menos comuns, podem impactar significativamente a qualidade visual pós-operatória e requerem seguimento cuidadoso.
Conclusão
Embora a cirurgia de catarata seja um procedimento seguro e altamente eficaz, é essencial que pacientes e médicos estejam atentos a fatores de risco para complicações como o descolamento de retina. A avaliação individualizada do paciente, com consideração de sua idade, grau de miopia, histórico ocular e condições anatômicas, é fundamental para a tomada de decisão cirúrgica e seguimento adequado.
Pacientes devem ser orientados a procurar atendimento oftalmológico imediatamente se notarem sintomas como flashes de luz, moscas volantes em excesso, sombra no campo de visão ou perda repentina da acuidade visual. Esses sinais podem indicar um descolamento de retina iminente ou em curso.
A prevenção passa por boa técnica cirúrgica, identificação precoce de fatores de risco e acompanhamento oftalmológico regular no pós-operatório. É dever do oftalmologista esclarecer ao paciente sobre os riscos e benefícios da cirurgia e garantir um plano de seguimento que permita identificar e tratar precocemente quaisquer complicações.
Por fim, é importante destacar que, mesmo com os riscos descritos, a cirurgia de catarata continua sendo uma das intervenções médicas mais seguras e com maior impacto positivo na qualidade de vida dos pacientes. Com planejamento adequado e acompanhamento criterioso, os benefícios da cirurgia superam amplamente os riscos envolvidos.
Dr. Aron Guimarães é médico oftalmologista especialista pela USP/SP e com mestrado e doutorado pela UNICAMP.
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Referências:
- AARONSON, Alexander et al. Cataract complications study: an analysis of adverse effects among 14,520 eyes in relation to surgical experience. Annals of Translational Medicine, v. 8, n. 22, p. 1541, 2020.
- CHEN, Kai-Yang; CHAN, Hoi-Chun; CHAN, Chi-Ming. Do people with diabetes have a higher risk of developing postoperative endophthalmitis after cataract surgery? A systematic review and meta-analysis. Journal of Ophthalmic Inflammation and Infection, v. 15, n. 24, 2025.
- OLSEN, Thomas; JEPPESEN, Peter. The incidence of retinal detachment after cataract surgery. The Open Ophthalmology Journal, v. 6, p. 79-82, 2012.
- POWELL, Shane K.; OLSON, Randall J. Incidence of retinal detachment after cataract surgery and neodymium:YAG laser capsulotomy. Journal of Cataract & Refractive Surgery, v. 21, mar. 1995. p. 132-138.
- THEVI, Thanigasalam et al. The Melaka Hospital cataract complications study: analysis of 12,992 eyes. Indian Journal of Ophthalmology, v. 65, n. 1, p. 24-29, 2017.
Perguntas de pacientes sobre o tema Descolamento de retina e catarata:
Tenho 65 anos e operei a catarata do olho direito há 4 meses. Um mês após a cirurgia comecei a ver uns pontinhos pretos passando na frente da visão e foram aumentando. Também passei a ver flashes de luz ou luzes pequenas piscando no canto da visão. Passei na consulta com o médico que dilatou a pupila e me disse que estava com descolamento da retina. Tive que passar por nova cirurgia. Nessa segunda cirurgia tive que colocar um óleo de silicone dentro do olho e me disseram que vou precisar de uma terceira cirurgia. Isso pode ter acontecido por alguma falha na cirurgia inicial? Tem alguma coisa diferente que eu poderia ter feito para não ter tido esse problema?
Resposta do Dr. Aron Guimarães: O descolamento de retina após a cirurgia de catarata pode ocorrer por diversos fatores, e nem sempre está relacionado a uma falha técnica. Pacientes com miopia, alterações na retina ou olhos mais alongados têm risco aumentado. O mais importante é o acompanhamento precoce e atento aos sintomas. A terceira cirurgia, geralmente, é para remoção do óleo de silicone, usado para estabilizar a retina.
Fiz cirurgia de catarata há 2 anos, mas agora minha visão piorou de repente. Vi uma sombra como se fosse uma cortina descendo. O que pode ser isso?
Resposta do Dr. Aron Guimarães: Esse sintoma é típico de descolamento de retina. A sombra ou “cortina” no campo visual indica uma emergência oftalmológica. Procure atendimento o quanto antes para avaliação e possível cirurgia reparadora.
Sou míope desde criança e agora, aos 58 anos, operei a catarata pelo convênio da Amil. Tenho risco maior de ter descolamento de retina por causa da miopia?
Resposta do Dr. Aron Guimarães: Sim, a miopia alta é um fator de risco importante para descolamento de retina, pois o globo ocular é mais longo, tornando a retina mais fina e suscetível a rupturas. O seguimento pós-operatório deve ser rigoroso.
Minha mãe tem plano da Unimed operou a catarata e agora disseram que ela tem “catarata secundária”. Isso também pode causar descolamento de retina? Usamos uma lente importada da marca Alcon.
Resposta do Dr. Aron Guimarães: A chamada catarata secundária é a opacificação da cápsula posterior, tratada com laser Nd:YAG. Em alguns casos, esse laser pode induzir tração vítrea e aumentar o risco de descolamento, especialmente em quem já tem predisposição.
Fiz facoemulsificação da catarata há 6 meses e comecei a ver moscas volantes. Isso é normal ou devo me preocupar?
Resposta do Dr. Aron Guimarães: Moscas volantes podem ser normais após cirurgia, mas se aumentarem de forma súbita, vierem com flashes ou perda de campo visual, é essencial buscar avaliação para descartar descolamento de retina.
Meu pai teve que fazer três cirurgias depois da catarata por causa da retina. Temos o convênio Sulamérica e colocamos a lente multifocal. Isso significa que a cirurgia inicial foi mal feita?
Resposta do Dr. Aron Guimarães: Nem sempre. Em muitos casos, o descolamento de retina ocorre por predisposição anatômica, e não por erro na cirurgia. A retina pode se comportar de forma imprevisível, exigindo múltiplas intervenções.
Quem tem diabetes tem mais risco de complicações na retina após a cirurgia de catarata?
Resposta do Dr. Aron Guimarães: Sim. O diabetes compromete os vasos da retina e aumenta o risco de complicações, como edema macular ou descolamento tracional. Manter o controle glicêmico e realizar acompanhamento oftalmológico é essencial.
Vi na internet que o laser usado para tratar a cápsula posterior pode causar descolamento de retina. Isso é verdade?
Resposta do Dr. Aron Guimarães: Existe um risco pequeno, principalmente em olhos predispostos. O laser Nd:YAG deve ser feito com cautela, após exame de mapeamento de retina e apenas quando realmente necessário.
Existe algum exame que possa mostrar se estou em risco de descolamento de retina?
Resposta do Dr. Aron Guimarães: Sim, o mapeamento de retina com pupila dilatada é o principal exame para identificar áreas frágeis ou rupturas na retina, ajudando na prevenção e tratamento precoce.
Já tive descolamento de retina em um olho. Se eu operar a catarata do outro, corro mais risco?
Resposta do Dr. Aron Guimarães: Sim. O histórico no olho contralateral aumenta o risco, principalmente após cirurgia de catarata. O planejamento cirúrgico deve considerar isso, e o acompanhamento precisa ser mais rigoroso.
Meu médico disse que tenho degeneração lattice. Isso pode virar descolamento?
Tem algo que posso fazer pra minimizar esse risco. Tenho convênio da Cassi. Resposta do Dr. Aron Guimarães: Sim. A degeneração lattice é uma alteração periférica da retina que pode levar a rupturas. Em alguns casos, é indicado fazer laser preventivo ao redor dessas áreas.
Existe alguma forma de prevenir o descolamento de retina após cirurgia de catarata?
Resposta do Dr. Aron Guimarães: Não há como evitar totalmente, mas o risco pode ser reduzido com exames pré-operatórios, avaliação de lesões predisponentes e acompanhamento oftalmológico contínuo.
Qual é o tempo mais comum para ocorrer o descolamento após a cirurgia?
Resposta do Dr. Aron Guimarães: A maioria ocorre nos primeiros meses após a cirurgia, mas o risco pode persistir por anos. Por isso, qualquer sintoma novo deve ser investigado, mesmo muito tempo depois do procedimento.
O óleo de silicone pode ficar permanentemente dentro do olho? Tive que colocar esse óleo após o descolamento da retina.
Resposta do Dr. Aron Guimarães: Em casos extremos, sim. Mas normalmente é removido após a retina estabilizar, entre 3 e 6 meses. A decisão depende da complexidade do caso.
Posso perder totalmente a visão por causa do descolamento?
Resposta do Dr. Aron Guimarães: Sim, se a mácula for atingida e o tratamento for tardio, a perda pode ser irreversível. O sucesso depende do tempo entre o início dos sintomas e a cirurgia.
Tenho 70 anos e vou operar a catarata (plano da Unimed). Devo me preocupar com descolamento?
Resposta do Dr. Aron Guimarães: Em pacientes mais idosos, o risco é menor. Mesmo assim, qualquer queixa visual nova deve ser comunicada. Flashes de luz e moscas volantes novas podem ser sinal de alerta. O importante é seguir as orientações do seu oftalmologista.
É normal ver uma mancha preta fixa no campo de visão depois da cirurgia?
Resposta do Dr. Aron Guimarães: Não. Manchas fixas podem indicar alterações retinianas e devem ser avaliadas imediatamente com mapeamento de retina.
Tenho glaucoma e vou operar a catarata (plano de saúde Hapvida). O glaucoma interfere no risco de descolamento?
Resposta do Dr. Aron Guimarães: Em geral, não diretamente. Mas algumas cirurgias combinadas ou uso prolongado de colírios podem tornar o olho mais sensível. A avaliação prévia é essencial.
O descolamento de retina tem cura?
Resposta do Dr. Aron Guimarães: Sim, especialmente se tratado precocemente. A cirurgia pode reverter o quadro e, muitas vezes, restaurar a visão, desde que a mácula não tenha sido afetada por muito tempo.
Existe algum sintoma silencioso do descolamento de retina?
Resposta do Dr. Aron Guimarães: Na maioria dos casos há sintomas, mas descolamentos periféricos podem passar despercebidos. Por isso, exames de rotina com mapeamento de retina são tão importantes, mesmo sem queixas.