Lente de Catarata para Pacientes com Doenças da Retina: Qual a Melhor Opção?
O que é catarata?
A catarata é uma condição oftalmológica comum caracterizada pela opacificação progressiva do cristalino, a lente natural do olho. Isso leva a uma visão embaçada, dificuldade para enxergar à noite, sensibilidade à luz e alterações na percepção de cores. A única forma eficaz de tratamento é a cirurgia de catarata, na qual o cristalino opaco é removido e substituído por uma lente intraocular (LIO).
Com o envelhecimento da população e o aumento da expectativa de vida, a catarata tornou-se uma das principais causas de cirurgia oftalmológica em todo o mundo. No entanto, quando o paciente também apresenta doenças na retina, a escolha da lente intraocular se torna um ponto crítico, exigindo uma abordagem mais criteriosa e personalizada.
Principais doenças que afetam a retina
A retina é uma estrutura fundamental para a visão, sendo responsável por transformar luz em sinais neurais. Várias doenças podem comprometer essa região, entre elas:
- Retinopatia diabética: complicação comum do diabetes que danifica os vasos sanguíneos da retina. Pode levar ao surgimento de edema macular, hemorragias e proliferação de vasos anormais.
- Degeneração macular relacionada à idade (DMRI): afeta a região central da retina, levando à perda da visão central. Pode ser seca (mais comum) ou exsudativa (mais agressiva). Alguns casos são tratados com injeção de medicamentos intravítreos.
- Membrana epirretiniana: formação de uma membrana fibrosa sobre a mácula, que pode causar distorção da imagem e baixa acuidade visual.
- Edema macular cistoide: acúmulo de líquido na mácula, geralmente após procedimentos cirúrgicos, como a cirurgia de catarata, ou devido a inflamações intraoculares.
- Descolamento de retina: separação da retina do fundo do olho, podendo levar à cegueira se não for tratado imediatamente.
Essas doenças podem coexistir com a catarata e interferir diretamente no prognóstico visual após a cirurgia. Por isso, a seleção da lente intraocular deve considerar as limitações anatômicas e funcionais da retina.
Qual lente intraocular escolher em pacientes com doenças da retina?
Pacientes com doenças retinianas requerem uma avaliação individualizada na escolha da LIO. De forma geral, a LIO monofocal é considerada a mais segura nesses casos, pois oferece melhor contraste visual e menor risco de comprometer a qualidade da visão.
Estudos demonstram que as LIOs multifocais, apesar de proporcionarem independência dos óculos, podem reduzir a sensibilidade ao contraste, o que é especialmente prejudicial em olhos já comprometidos por doenças da retina.
Em condições como retinopatia diabética, DMRI e membrana epirretiniana, essa perda adicional de contraste pode impactar diretamente na qualidade da visão pós-operatória.
Além das monofocais, existem opções como lentes asféricas, tóricas (para correção do astigmatismo) e lentes com filtro de luz azul, que podem ser benéficas em pacientes com determinadas condições retinianas. A lente asférica, por exemplo, pode oferecer melhor qualidade de imagem em ambientes com pouca luz, algo desejável para pacientes com retina fragilizada.

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Riscos do uso de lentes intraoculares multifocais em pacientes com doenças da retina
As LIOs multifocais funcionam dividindo a luz em diferentes focos, o que exige um sistema visual intacto para uma boa neuroadaptação. Em pacientes com alterações retinianas, isso pode resultar em:
- Redução na sensibilidade ao contraste.
- Piora na visão noturna.
- Maior incidência de halos e glare.
- Dificuldade de leitura em ambientes com pouca luz.
- Sensibilidade aumentada a reflexos e fontes luminosas intensas.
Além disso, a neuroadaptação às LIOs multifocais pode ser comprometida em pacientes que já apresentam disfunção macular ou instabilidade de fixação. Isso leva a uma maior taxa de insatisfação pós-cirúrgica e, em casos mais graves, necessidade de explante da lente.
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Aspectos específicos em pacientes diabéticos. Qual a melhor lente para o paciente com diabetes?
Em pacientes com diabetes, especialmente aqueles com retinopatia diabética ativa ou edema macular, é fundamental que o controle glicêmico e o tratamento da doença retiniana sejam otimizados antes da cirurgia de catarata. Estudos apontam maior risco de complicações, como edema macular cistoide e opacificação da cápsula posterior, nesses pacientes
.A presença de alterações retinianas também limita a previsibilidade dos resultados refrativos. Portanto, lentes que priorizem a qualidade da imagem, mesmo que dependam de óculos para visão próxima, são preferíveis. LIOs monofocais são a primeira escolha se já houver retinopatia diabética.
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O papel da avaliação pré-operatória e dos exames complementares
Para uma escolha segura da lente intraocular, é indispensável uma avaliação detalhada do fundo de olho, com exames como:
- Tomografia de coerência óptica (OCT): essencial para identificar alterações maculares sutis, como edema ou membrana epirretiniana.
- Angiografia fluoresceínica: indicada nos casos de retinopatia diabética e suspeita de neovascularização.
- Retinografia: permite documentar alterações da retina e acompanhar a evolução pós-operatória.
Esses exames ajudam a definir o grau de comprometimento retiniano e guiam a decisão sobre o tipo de lente mais adequado.

A importância do acompanhamento com o especialista em retina A parceria entre o cirurgião de catarata e o retinólogo é vital para garantir o sucesso do procedimento em pacientes com patologias retinianas. O acompanhamento conjunto permite:
- Controle efetivo da doença retiniana antes e depois da cirurgia.
- Planejamento individualizado da cirurgia de catarata.
- Monitoramento precoce de complicações como edema macular ou descolamento de retina.
Esse cuidado integrado é essencial para otimizar o resultado visual e proporcionar maior segurança ao paciente.
O impacto na qualidade de vida
Para muitos pacientes, recuperar a visão com a cirurgia de catarata representa mais do que um ganho funcional: significa voltar a enxergar os rostos da família, ler com autonomia, caminhar com confiança e retomar atividades do cotidiano com segurança.
Entretanto, é preciso alinhar expectativas realistas. Quando há comprometimento da retina, mesmo com a catarata removida, o resultado final pode não atingir 100% da visão. Por isso, a comunicação clara entre o médico e o paciente é tão importante quanto a escolha da lente intraocular.
Avanços em tecnologias de lentes intraoculares
Novas gerações de LIOs estão sendo desenvolvidas para tentar equilibrar qualidade visual e independência de óculos, com menor perda de contraste. As lentes com foco estendido (EDOF) têm sido estudadas como alternativa intermediária para casos selecionados.
No entanto, mesmo essas lentes exigem cautela em olhos com doenças da retina. Estudos mais robustos ainda são necessários para validar sua segurança nesses cenários.
Conclusão
Pacientes com doenças da retina, como a retinopatia diabética, devem ser avaliados com cautela na escolha da lente intraocular. Embora as lentes multifocais ofereçam benefícios para muitos pacientes, elas não são recomendadas na maioria dos casos com comprometimento retiniano. As lentes monofocais, por preservarem a sensibilidade ao contraste e proporcionarem boa visão à distância, continuam sendo a opção mais segura.
A decisão deve ser personalizada, levando em consideração não apenas os dados clínicos e os exames complementares, mas também as expectativas e estilo de vida do paciente. O acompanhamento multidisciplinar com o retinólogo pode ser fundamental para o sucesso da cirurgia e satisfação do paciente.
Caso você tenha alguma doença da retina e está planejando uma cirurgia de catarata, converse com seu oftalmologista sobre as opções mais seguras e adequadas ao seu caso. Uma escolha bem feita pode significar mais segurança e qualidade de vida no seu futuro visual.
Dr. Aron Guimarães é médico oftalmologista especialista pela USP/SP e com mestrado e doutorado pela UNICAMP.
Perguntas que recebemos sobre o tema:
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Doutor, tenho 68 anos, sou diabética há 25 anos e fui diagnosticada com início de catarata. Também tenho retinopatia diabética. Posso colocar lente multifocal para ficar livre dos óculos?
Olá! Em pacientes com retinopatia diabética, principalmente com longo tempo de doença, o ideal é optar por uma lente monofocal. As lentes multifocais reduzem a sensibilidade ao contraste e podem não oferecer boa qualidade visual em olhos com alterações na retina. Nossa prioridade é preservar sua visão com segurança.
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Tenho 72 anos, DMRI seca e estou para operar catarata. Uso óculos o tempo todo e queria uma lente que me livrasse deles. Isso é possível?
A independência dos óculos é um desejo comum, mas no seu caso, com DMRI seca, o mais importante é manter a melhor qualidade visual possível. As lentes multifocais não são recomendadas, mas podemos discutir opções como lentes monofocais otimizadas para meia distância ou leitura, dependendo do seu estilo de vida.
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Meu nome é Paulo, tenho 60 anos, e fui operado de descolamento de retina no olho direito. Agora preciso operar a catarata. Posso colocar uma lente premium (multifocal) nesse olho?
Olá, Paulo! Após descolamento de retina, especialmente se houve cirurgia vítreo-retiniana, o ideal é uma lente monofocal. A retina pode não ter uma performance plena para neuroadaptação exigida por lentes multifocais. A prioridade é manter estabilidade retiniana e boa visão central.
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Doutor, minha mãe tem 75 anos, é hipertensa, diabética e já teve edema na mácula. O oftalmo sugeriu cirurgia de catarata. Qual lente o senhor indica?
Em casos como o da sua mãe, a lente monofocal é a mais indicada. Ela oferece maior previsibilidade, melhor contraste e menor risco de insatisfação visual. A escolha precisa ser feita com base na saúde da retina, e pacientes com edema macular têm maior chance de complicações com lentes multifocais.
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Tenho 66 anos e já tratei uma membrana epirretiniana no olho esquerdo. Agora vou operar catarata nos dois olhos. Posso colocar multifocal no olho direito e monofocal no esquerdo?
É possível, mas essa combinação exige muito cuidado. A diferença de qualidade de imagem entre os dois olhos pode causar desconforto. Em geral, pacientes com histórico de membrana epirretiniana se beneficiam mais de lentes monofocais em ambos os olhos.
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Sou fotógrafo amador, 70 anos, com início de catarata e retinopatia diabética leve. Queria manter uma boa visão de contraste. Qual lente o senhor recomenda?
Para sua atividade, a qualidade de imagem e o contraste são fundamentais. A lente monofocal asférica ou monofocal tórica pode ser a melhor escolha. Ela oferece excelente nitidez, inclusive em ambientes com baixa luminosidade, algo essencial para fotografia.
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Doutor, tenho 59 anos, alta miopia e já fiz vitrectomia por hemorragia vítrea. Agora tenho catarata. Posso usar lente multifocal tórica?
Alta miopia e histórico de vitrectomia aumentam os riscos cirúrgicos e podem afetar a estabilidade da lente. A multifocal tórica geralmente não é recomendada nesses casos. Prefira uma lente monofocal tórica para corrigir o astigmatismo com segurança e manter boa qualidade visual.
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Minha esposa tem 65 anos, nunca teve problema de retina, mas tem histórico familiar de DMRI. Isso impede o uso de lente multifocal?
Se ela não apresenta alterações na retina atualmente, pode ser considerada para lente multifocal. Porém, é importante realizar uma tomografia de coerência óptica (OCT) para garantir que não há sinais iniciais de degeneração macular. O acompanhamento deve ser rigoroso no pós-operatório.
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Tenho 73 anos, moro sozinho e preciso dirigir à noite. Tenho catarata e já tive edema macular no olho direito. Lente multifocal é segura?
Neste cenário, não. A lente multifocal pode piorar a visibilidade noturna, aumentar halos e reflexos. O ideal é uma lente monofocal, que oferece melhor contraste e desempenho visual em situações de pouca luz, como dirigir à noite.
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Doutor, sou professora aposentada, leio muito e tenho 69 anos. Tenho catarata e DMRI seca leve. Não queria usar óculos para perto. Existe alguma alternativa?
Uma alternativa possível é ajustar a lente monofocal para foco intermediário ou perto em um dos olhos (monovisão leve), se você tolerar. Outra possibilidade é usar lentes com foco estendido (EDOF), mas com muito critério. O fundamental é proteger a retina e manter boa qualidade visual.
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Doutor, tenho 62 anos, faço acompanhamento com retinólogo por causa de DMRI e estou com catarata avançada. Já uso óculos multifocal. Existe alguma lente que me permita continuar vendo bem de longe e perto?
Olá! Com a presença de DMRI, mesmo em estágios iniciais, o ideal é evitar lentes multifocais. Uma alternativa seria optar por uma lente monofocal ajustada para perto em um olho e para longe no outro (monovisão), mas isso requer testes prévios de adaptação. Em geral, priorizamos qualidade visual e contraste, especialmente em quem já tem acompanhamento com o retinólogo.
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Tenho 65 anos, sou diabético e já operei um olho com lente monofocal. Agora vou operar o outro e queria tentar uma multifocal. Isso é viável?
Quando há diabetes envolvido, principalmente se há qualquer grau de retinopatia, recomendamos manter a consistência entre os olhos. Usar lentes diferentes pode gerar desconforto e má adaptação. A lente monofocal no segundo olho provavelmente será a escolha mais segura e confortável.
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Meu pai tem 79 anos, é ex-tabagista, com catarata e sinais iniciais de DMRI. Ele está ansioso com a cirurgia. O senhor recomenda alguma lente especial?
Com sinais de DMRI, ainda que iniciais, a melhor conduta é a lente monofocal, preferencialmente com filtro para luz azul. Esse tipo de lente ajuda a proteger a mácula da luz nociva e preserva o contraste visual, que é essencial para pacientes idosos e com alterações na retina.